Adaptar os sistemas naturais e humanos às alterações e variabilidade climática não é algo completamente novo na Região Autónoma da Madeira. A sociedade está habituada a lidar com a variabilidade climática de forma autónoma, e muitas são as ações que visam lidar com os seus impactes ,sobretudo decorrentes de eventos meteorológicos extremos. Assim, a adaptação autónoma às alterações climáticas pode e está a acontecer a diferentes escalas, desde o cidadão à intervenção em grandes infraestruturas. No entanto, dado o conhecimento atual sobre os cenários climáticos futuros, urge a necessidade de se integrar estas projeções climáticas de forma antecipatória, ou seja, planeada no processo de adaptação.

De acordo com as mais recentes revisões do estado da ciência das alterações climáticas, pelo Painel Intergovernamental para as Alterações Climáticas, dada a quantidade de gases com efeito de estufa existentes na atmosfera e a inércia do sistema terrestre, as alterações climáticas serão, em certa medida, inevitáveis. Para além disso, os esforços para a redução de gases com efeito de estufa (mitigação) têm estado aquém dos desejáveis, para um Planeta climaticamente estável. Deste modo, existem já várias razões para começar imediatamente o processo de adaptação às alterações climáticas.

Princípios

A adaptação é um processo em contínuo desenvolvimento que irá ocorrer num horizonte temporal de longo prazo e levado a cabo por diversos agentes. A Estratégia CLIMA-Madeira propõe um conjunto de princípios genéricos orientadores que dão lhe suporte, ajudam a direcionar a ação e recomendam um conjunto de decisões específicas.

  • Promoção do Desenvolvimento Sustentável do arquipélago – A adaptação deverá ser realizada tendo em conta o equilíbrio entre as várias dimensões do desenvolvimento sustentável:
    • Ambiente:
      • As medidas de adaptação devem ter um efeito positivo sobre a preservação dos recursos naturais da RAM e potenciar os serviços dos seus ecossistemas.
      • Deve ser dado ênfase às medidas que beneficiam a biodiversidade, em particular em relação às espécies endémicas.
    • Economia:
      • Devem ser beneficiadas as medidas de adaptação com o melhor rácio custo-benefício, considerando todos os custos (monetário e não monetários) e benefícios diretos e induzidos.
      • Prioridade para as medidas que sejam “sempre positivas”, independentemente das alterações climáticas, e que tenham benefícios secundários para vários setores da RAM.
    • Sociedade:
      • Devem ser beneficiadas medidas de adaptação que não prejudiquem nenhum grupo social, que encorajem a coesão social, sendo que os custos da adaptação devem ser suportados por todos e não só aqueles diretamente afetados pelo evento climático (princípio da solidariedade).
      • A adaptação deve limitar ao mínimo possível as escolhas das gerações futuras (princípio da flexibilidade), sendo que em caso de dúvida a escolha deve ser de prevenção do impacte (princípio da precaução).
  • Assumir a responsabilidade: haverá um compromisso e apoio claro por parte dos decisores da RAM à Estratégia CLIMA-Madeira, incorporando a responsabilidade de adaptar os sistemas através do apoio político, legislativo e financeiro.
  • Trabalhar com as incertezas: as incertezas fazem parte de todas as estratégias e políticas, tal como acontece na temática das alterações climáticas. Estas não devem ser um argumento à inação, pelo que se devem encontrar formas de lidar e incorporar as incertezas no processo de decisão.
  • Envolver as parte interessadas: O desenvolvimento e implementação da Estratégia CLIMA-Madeira devem envolver os vários agentes representantes da sociedade da RAM, completando-a com o conhecimento empírico e a experiência local, num processo colaborativo de comunicação fluida e bidirecional.
  • Partilha de informação: para promover a aprendizagem mútua com outros atores, deve haver uma melhoria contínua do conhecimento através da partilha e comunicação de informação relevante. A informação científica deve ser apresentada de forma acessível aos vários públicos-alvo. Também a terminologia usada deve ser acordada e homogeneizada entre os vários setores.
  • Promover a cooperação: trabalhar em parceria é essencial em todo o processo de adaptação. A cooperação deve integrar as partes afetadas pelas alterações climáticas, as partes responsáveis pela implementação das medidas de adaptação e pelos facilitadores do sucesso da adaptação. A cooperação com investigadores e peritos locais é essencial, uma vez que os decisores necessitam do seu conhecimento para lidarem melhor com a incerteza e adotar medidas eficazes.
  • Ponderar uma vasta gama de opções: durante o planeamento da adaptação, deve ser considerada uma vasta gama de opções de adaptação. Devem ser medidas dedicadas ao impacte, mas também medidas transversais aos vários setores.
  • Priorização das medidas: deve ser tido em conta que os recursos disponíveis para a adaptação são limitados, pelo que deve haver uma priorização das medidas de adaptação, sendo que se podem definir critérios para apoiar o processo, refletindo a posição de diversos agentes.
  • Integrar nos instrumentos e estruturas existentes: as medidas de adaptação propostas devem ser integradas no ciclo de decisão da RAM, utilizando para isso os instrumentos de governança e as estruturas já existentes, tornando o uso de recursos mais eficiente. É também necessário ter em consideração que o clima não é o único perigo para a RAM e que esta é afetada por vários fatores não-climáticos, como sejam os socioeconómicos. Deste modo, a Estratégia CLIMA-Madeira deve estar ligada a outros instrumentos estratégicos da RAM.
  • Planeamento sistémico: o carácter eminentemente sistémico da adaptação leva a que esta não possa ser objeto de tratamento isolado e linear. O esforço de adaptação deve ser transversal à sociedade, numa abordagem que envolva, de forma integrada, outros sistemas não considerados prioritários na estratégia e considerando as diferentes escalas da RAM.
  • Evitar conflitos: Durante o planeamento da adaptação, deve haver um balanço entre medidas de curto e longo-prazo e entre setores. Devem ser evitadas medidas que contradigam os objetivos da própria estratégia de adaptação e de outras estratégias da RAM.
  • Mitigação: As medidas de adaptação equacionadas devem, sempre que possível, contribuir para a redução de gases com efeito de estufa atmosféricos. Deve ser dado especial prioridade a adaptação baseada em ecossistemas que visam a captura e sequestro de carbono ao mesmo tempo que aumentam a resiliência do território.
  • Avaliar e monitorizar: A adaptação é um processo contínuo e não um objetivo próximo pelo que requer uma revisão regular segundo indicadores de monitorização que permitam avaliar a eficácia das medidas implementadas e realimentar a estratégia num processo de melhoria contínua.

Áreas transversais

As áreas transversais definem possíveis linhas de atuação para operacionalizar a Estratégia CLIMA-Madeira. Estas áreas refletem os temas mais relevantes para a estratégia e que são transversais aos setores prioritários. Estas áreas pretendem evitar a forma isolada como se aborda a adaptação, promovendo uma abordagem sistémica no processo.

Investigação e inovação

Esta área deverá promover a ciência e o conhecimento em temas relevantes para a realização da Estratégia CLIMA-Madeira desenvolvendo uma agenda regional de prioridades de investigação, inovação e demonstração de adaptação, apoiando protocolos de cooperação entre instituições científicas e as entidades envolvidas na Estratégia CLIMA-Madeira e facilitando a sua ligação e participação em redes internacionais de investigação.

Esta área concretizar-se-á reforçando e aprofundando a coordenação e a cooperação entre programas de investigação internacionais, nacionais e regionais; melhorando o conhecimento sobre os impactes, vulnerabilidades e adaptação às alterações climáticas; fomentando atividades conjuntas para o acesso a fundos regionais, nacionais e europeus de investigação; iniciando um programa de médio-longo prazo de investigação sobre adaptação às alterações climáticas na RAM e na Macaronésia.

Resiliência aos atuais extremos climáticos

Os eventos climáticos extremos são uma prioridade óbvia para a RAM, cujos impactes são transversais aos vários setores. Desta forma, os aluviões e os fogos florestais devem ser tratados de forma integrada.

Esta área deverá incentivar a melhoria contínua da capacidade adaptativa da RAM e dos vários subsistemas à atual variabilidade climática, em particular aos eventos extremos, através da promoção e acompanhamento de ações que visem aumentar a atual resiliência dos vários setores e da integração de medidas de adaptação nos vários instrumentos de governança vigentes a todas as escalas relevantes para uma coerente implementação da Estratégia CLIMA-Madeira.

Prevenir tendências de longo-prazo

Esta área deverá promover o planeamento sistémico e implementação atempada de medidas que confiram a resiliência de longo prazo da RAM às alterações climáticas. Pretende-se uma adaptação robusta que integre os vários cenários de alterações climáticas, que lide com as incertezas associadas, com um compromisso institucional estável, e com a flexibilidade necessária para incorporar as lições aprendidas resultantes de planos de monitorização de longo prazo.

No longo-prazo, os perigos climáticos com origem em elementos atmosféricos únicos e com origem em elementos atmosféricos compostos que se considera mais relevantes para a RAM são o aumento da temperatura, as ondas de calor, os fogos florestais, as secas, as chuvas torrenciais, as tempestades, a acidificação dos oceanos e o nível médio do mar.

Comunicação e capacitação

Esta área deverá apoiar o desenvolvimento, sistematização, visualização e disseminação da informação necessária para a realização da Estratégia CLIMA-Madeira através do incentivo a: adoção de planos de comunicação tendo em vista a sensibilização e consciencialização da população em relação ao tema das alterações climáticas; capacitação em adaptação dos vários agentes da RAM através de ações de formação estratégicas; e difusão do conhecimento nos organismos públicos, nas empresas e nas organizações não-governamentais e outros organismos privados.

A comunicação e a capacitação dos agentes aumentam o seu nível de consciência e também a capacidade adaptativa da RAM. O Observatório CLIMA-Madeira terá um importante papel nesta área dado que é uma plataforma de partilha, tratamento e divulgação de informação entre todos os agentes da RAM sobre o clima e alterações climáticas, podendo ser a base para apoiar a articulação das várias entidades regionais com vista a desenvolver uma estratégia de comunicação comum.